5 de nov. de 2010

Sticker, uma manifestação versátil

Efetuar Intervenções Urbanas exige pensar em qual tipo de material, mensagem e local para se praticar. As Intervenções não são apenas uma forma de exibir a estética de uma arte, mas sim uma manifestação que retrata uma forma de expressão crítica baseada em um tipo de arte.

Esses elementos são fundamentais para esclarecer que as manifestações não são apenas um instrumento de imposições estéticas, mas sim algo que tem como essência a mudança de uma realidade que assusta, apaixona, intriga. O sticker, por exemplo, muitas vezes surge com o intuito de vangloriar o nome de seus autores devido a quantidade de adesivos dispersos na cidade. Os criadores querem mostrar sua expressão para quem possuí olhos atentos, eles querem que sua arte seja admirada por quem mereceu descobrí-la.


O Sticker

Com alta proporção de poluição visual que a cidade carrega, novos tipos de linguagens são criadas. O sticker é um exemplo disso, este que tinha como ideia a divulgação da arte através do papel adesivo, originou-se da mistura do grafite com o material do lambe-lambe.

O lambe-lambe é um pôster de papel fixado com cola líquida que pode ser caseira, feita com a mistura de alimentos ou industrializada, que é geralmente colocada em postes e muros na rua. A princípio era usado como publicidade e divulgação, quando não existiam veículos fonográficos, marcava presença na sociedade divulgando fotos de pessoas desaparecidas ou procuradas por infringir as leis, usada também na divulgação de shows musicais. Hoje, ela ainda segue esses princípios e passa a têndeciar-se cada vez mais como arte. O que antes eram só posters de tamanhos grandes, o lambe-lambe atualmente segue muitos tipos de formato.

Apoiando-se nisso, o sticker surge como uma evolução do lambe-lambe, que a princípio aparece no Brasil na decoração de residências e lojas, e logo passa a ser popularizada por grupos urbanos na década de 90. Sua principal diferença em relação ao lambe-lambe é que seu material já vem com cola e geralmente já é produzido em tamanho pequeno.


Adesivo é a tradução para esse termo da língua inglesa, porém se formos verificar os vários significados encontramos “adepto, indivíduo perseverante, trabalho incansável e algo que demora muito”. É interessante analisar pois estas são as várias facetas que definem bem o que o sticker representa no contexto urbano, já que cada intervencionista quer aproveitar e reutilizar os espaços da cidade tais como orelhões, placas, fachadas de lojas, latas de lixo e postes de semáforo, um a um.


Disputa entre "Adesiveiros"


As propostas de intervenção em espaços inusitados buscam abrir novas possiblidades de se perceber a habitação urbana. A disputa entre os praticantes é bastante parecida com a dos pichadores, o autor que cola sua arte no lugar mais alto ou complicado mostra a superioridade de sua arte perante as outras, isso também, além de deixa-la num lugar de difícil acesso para quem for quiser apagá-la ou retirá-la. Diferentemente dos pichadores, os stickers (nome dado também a quem produz e cola os stickers) não foram educados a modificar a arte de seus companheiros, pois o sticker não possuí a finalidade de demarcação de território, é isso que torna a disputa sadia entre os praticantes.


Simples

A facilidade de manuseio, o fácil acesso em conseguir o material e o baixo custo que eles possuem tem trazido cada vez mais adeptos a este universo artístico. Tanto pessoas inexperientes, quanto artistas mais experientes desse contexto, tem procurado se expressar através de uma arte singela que pode ser rapidamente feita e propagada ao redor da cidade, e isso porque ela não exige uma técnica apurada. Os autores não somente podem elaborar seu prórpio desenho mas também podem copiar imagens já criadas como foto de cantores ou revolucionários.


Uma Arte Globalizada

Com a fácil mobilidade e praticidade em conduzi-la à qualquer lugar, a troca de experiências com outras pessoas torna-se muito mais eficiente. É como um CD que você pode compartilhar e divulgar sua obra com qualquer tipo de pessoa. Em vista disso, o sticker se torna mais uma ferramenta de troca de cultura que vem ganhando força com a proliferação do universo undeground.

Baseando-se nessa troca de cultura foi criada a “Expo Sticker”, um evento focado na cultura do sticker art, realizado em vários estados do Brasil e do mundo. Esta exposição conta com artistas e admiradores da arte, pessoas de qualquer lugar do mundo podem participar comprando o ingresso ou enviando seu sticker através de uma carta para o destinatário da organização do evento. Vale salientar que não existe premiação ou qualquer estímulo em fazer a arte para conseguir dinheiro. É apenas uma confraternização entre simpatizantes e artistas anônimos da mesma arte.

O mais interessante de estar presente nesse evento é pegar o sticker de qualquer pessoa do mundo e publicar na internet o vídeo ou foto da obra dela sendo colada. Muitos artistas se tornam conhecidos internacionalmente por causa disso.


Com toda essa interatividade entre os usuários, o sticker se torna uma das Intervenções Urbanas com maior ação colaborativa e de ampliação de intercâmbio cultural, expandindo a sua participação para outras plataformas, como a internet.

Além das exposições, também existem oficinas que ensinam como fazer sua arte. Esse tipo de manifestação se intensifica na medida que a cidade se expande. Com a rápida proliferação do sticker no âmbito urbano nos últimos 5 anos, a cidade de São Paulo, a sexta maior do mundo, por sua rápida transformação espacial e crescimento populacional, passou a ser o maior centro desse tipo de intervenção no Brasil. Um fato curioso é que este ato tem eclodido aos arredores do território paulista. Estados como Rio de Janeiro, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e principalmente Paraná tem se envolvido cada vez mais com essa manifestação. Tanto é que o “Expo Sticker” já migrou para as cidades de Curitiba, Belo Horizonte e Porto Alegre.


Força Ideologica

Pelo tamanho que apresenta, o sticker pode ser visto como um pedaço inofensivo de arte. Porém, ele faz parte de uma imensa manifestação artística e, mesmo sendo uma arte simples que não requer genialidade, se torna uma grande ferramenta com poder eficaz nas mãos de quem a conduz. Com o poder de se dispersar em instantes, ela age como um enxame de insetos na cidade. Com isso, se torna difícil de ser censurado e ignorado, construindo uma natureza provocativa, que não possui limites tanto nas ideias quanto no tipo de material a ser usado. Mesmo que existam regras aplicadas pelo poder público que administra todo o contexto urbano, que tenham intuito de deter o ato dos praticantes e impedir a explosão das expressões artístas na cidade, será difícil convencer os adeptos a esse movimento deixar de exercer este oficio. O próprio fato do poder público interferir com leis e regulamentações que controle a prolieração dessa expressão alimenta a vontade de manter a arte viva.


Manifestação Plural


Existe uma história que surgiu na época em que o muro de Berlin já havia sido derrubado: Dois trabalhadores encontraram na parte leste do muro um brinquedo enterrado. Era antigo, feito de lata e embrulhado dentro de um saco plástico. Os dois trabalhadores curiosos resolveram abrir a sacola para ver o que iriam encontrar e um deles, ao ver o brinquedo, descobriu que aquilo era um dirigivel. O outro trabalhador, encostado do outro lado do muro, via que aquilo era, sem dúvida, um submarino. Com essas distintas interpretações os dois homens que ao segurarem o brinquedo pelas mãos observavam lados opostos de uma mesma coisa. Esta é uma excelente metáfora aos olhos que vivem a cidade: as múltiplas representação e os habitantes que nela residem possuem diversas possibilidades de encarar e dar um sentido a ela.

Conforme vão surgindo novas vertentes de Intervenções, a cidade vai fazendo parte de um grande ciclo de movimentos artísticos que só tendem a evoluir na medida que o tempo avança e enquanto o senso do espaço público continuar existindo, isso nunca acabará. As Intervenções Urbanas sempre serão uma sombra de tudo aquilo que representa a cidade.

Nenhum comentário: